quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

ARTIGO: Como pode faltar água na Baixada Santista com tanto investimento?

Por Ovanir Marchenta Filho
A SABESP – Cia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo, concessionária de serviços de água e esgotos, opera em toda a Baixada Santista e investiu muito na última década, tanto em coleta e tratamento de esgoto como em abastecimento de água. Como é possível então faltar água em alguns pontos de algumas cidades?
Vejamos: O abastecimento de água depende basicamente da Produção, da Reservação, da Distribuição e das Perdas Físicas. 
O maior Sistema Produtor da Baixada Santista é o da Estação de Tratamento de Água de Cubatão, que capta água na saída do canal de descarga da Usina de geração de Energia Elétrica Henry Borden, cuja água tem origem na Represa Billings, além de captar também no Rio Pilões.
Essa ETA é responsável por mais da metade da vazão produzida na Baixada Santista. Nos últimos anos foram executadas obras para aumento de capacidade tanto na captação quanto no tratamento. Nas outras ETAs da Baixada, para se produzir água tratada tem-se que captar água bruta nos mananciais que estão na Serra do Mar. Uma das características principais desses rios é a declividade acentuada, em vales íngremes e em área de preservação permanente, o que inviabiliza a construção de barragens de acumulação de água bruta, tanto na análisen técnica quanto ambiental. A vazão de cursos de água com esse perfil depende de chuvas finas e constantes, que carregam toda a bacia de influência. Se não houver chuva por períodom prolongado pode ocorrer redução de vazão de captação.
Nos últimos anos foram executadas obras com implantação de novas ETAs principalmente em Guarujá, Itanhaém e São Vicente, com aumento substancial na produção.
No Sistema de Abastecimento da Baixada, existem vários reservatórios para acumulação de água tratada, que teoricamente estão dimensionados para atender as grandes demandas, sendo um deles o Reservatório Túnel, um dos maiores do Estado de São Paulo.
Nos últimos anos foram construídos vários reservatórios principalmente em Guarujá, Praia Grande e Itanhaém, com aumento da capacidade de reservação. Para aduzir toda a água produzida nos vários Sistemas Produtores da Baixada Santista considerando os detalhes de cada um e a localização dos vários reservatórios, existe uma malha de adutoras que interliga praticamente todos esses sistemas de abastecimento, sendo possível então, mandar água de um sistema para outro, na medida das necessidades. Apenas o Sistema de Bertioga fica Isolado.
Nos últimos anos foram assentados vários quilômetros de adutoras interligando melhor os sistemas, principalmente em Guarujá, Praia Grande, Mongaguá e Itanhaém, aumentado muito a versatilidade de abastecimento.
Outra variável importante no sistema de abastecimento é o gerenciamento das perdas físicas. Nos últimos anos se tem investido muito na detecção de vazamentos e na reformulação das redes de distribuição com implantação de setores que permitem o monitoramento das vazões e pressões, facilitando os diagnósticos de anomalias e acelerando as correções, principalmente em Guarujá e Praia Grande.
Todos esses sistemas de abastecimento citados foram projetados considerando que a população na Baixada Santista é praticamente fixa de segunda a sexta feira, com variações grandes nos fins de semana e variações muito grandes nos feriados prolongados.
Como pode faltar água com todo esse investimento se a SABESP se preparou para fazer um bom atendimento, com investimentos em obras e treinamento do seu pessoal?
Nesse final de ano de 2013 com os feriados de Natal e Ano Novo caindo na quarta feira, e considerando que várias empresas marcam férias coletivas nesse período, criou-se um super feriado prolongado.
Houve um grande apelo turístico na mídia, convidando a todos para as tendas de eventos, shows e queima de fogos em todos os municípios. A região da Baixada Santista está em franco desenvolvimento, com vários empreendimentos, muitos deles fora do eixo tradicional para grandes edifícios.
O acesso à região da Baixada Santista se da pelas melhores estradas do Estado. Esses atrativos, aliados à melhora do poder aquisitivo da população como um todo, contribuiram para que houvesse um grande afluxo de pessoas para curtir uma mini férias na Baixada Santista, sendo que em algumas cidades a população triplicou. Essa ocupação recorde mudou  até o perfil de ocupação em bairros historicamente estáveis.
Essas pessoas em férias querem ficar à vontade nas praias, sair da rotina e aproveitar o que as cidades oferecem, e consumem mais água. Todos esses aspectos analisados, previsíveis, foram considerados e planejados. Mas como pode faltar água?
Durante 11 dias consecutivos não choveu na Baixada Santista justamente nesse período de população recorde, o que não ocorre a décadas, mostrando que as mudanças de clima estão cada vez mais imprevisíveis. A temperatura e a sensação térmica nesse período ficaram em torno de 40°C. O consumo de água per capta nessas condições ficou altíssimo.
Para piorar a situação, houve falta de Energia Elétrica no principal Sistema Produtor por várias horas. A falta de Energia Elétrica por um período longo num sistema tão importante provocou o esvaziamento parcial dos reservatórios que seriam utilizados nas horas de maior consumo, prejudicando grande parte da operação planejada.
Foram feitas todas as operações de transferências de um sistema para outro, utilizadas dezenas de caminhões tanque, mas houve falta de água em alguns pontos em algumas cidades.
Porém, nessa condição extremamente desfavorável onde há o imponderável. Não se pode atribuir a falta de planejamento somente à SABESP, pois não é admissível se ter um sistema de abastecimento considerando todas as variáveis no ponto mais crítico, para atender esse grande número de pessoas, por apenas alguns dias. Durante 350 dias do ano o abastecimento foi normal em todas as cidades da Baixada.
Há que se considerar, entretanto, que além da SABESP continuar com os estudos e as obras, outros atores devem ser incluídos para o planejamento das atividades dos feriados prolongados e principalmente dos finais de ano. A Agência da Região Metropolitana da Baixada Santista, as Prefeituras, a Concessionária de Energia Elétrica e sua Agência Reguladora, o Ministério Público, além da Sabesp, devem manter uma discussão mais ampla para um diagnóstico metropolitano das atividades dos períodos de grande afluxo de pessoas, para que elas sejam tratadas com dignidade e transparência e que aproveitem bem as horas de descanso.
Há de se ter um plano de mídia para informar e orientar as pessoas quanto à ocupação adequada dos imóveis, quanto ao uso racional da água e quanto ao aumento de reservação nos imóveis, entre outras providências.
É imprescindível também se discutir as ocupações irregulares de áreas, onde teoricamente é proibido o abastecimento de água, como se fosse possível seres humanos lá viverem e sem água. São nessas áreas onde ocorrem as principais perdas físicas de água. Existem ocupações com famílias que já estão na terceira geração, e ainda são consideradas irregulares.
Há de se ter aprovação de instalações de água e esgotos provisórias nessas áreas, eliminando-se os “gatos”, com o compromisso de retirada das instalações assim que ocorram as remoções das pessoas.
Um atendimento com quantidade e qualidade adequadas é um direito das pessoas que visitam a Baixada Santista e um dever de todas as Entidades de Serviços Públicos envolvidas.

Ovanir Marchenta Filho é Engenheiro civil, Especializado em Saneamento Básico e Ambiental e Presidente da Subseção ABES Baixada Santista.

Artigos assinados são responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, a posição da ABES.
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