Você que costuma acompanhar as
notícias sobre desenvolvimento sustentável saberia definir o que é Redd+
(Redução de Emissões por Desamatamento e Degradação Florestal)? Se a sua
resposta for sim, cuidado. Talvez você ainda não saiba. "Há bastante
confusão sobre este tema. Tem iniciativas batizadas de Redd, projetos que se
auto-intitulam como Redd, mas que às vezes não condizem com o mecanismo",
alerta Natalie Unterstell, gerente de mudança do clima e florestas (DPCD), da
secretaria de mudanças climáticas e qualidade ambiental do Ministério do Meio
Ambiente.
Em entrevista ao EcoD, ela
esclarece como tem sido feitas as negociações referentes a esse mecanismo, um
dos temas mais discutidos nas últimas conferências das Nações Unidas sobre
mudanças climáticas. Natalie também destaca como esse tema pode ser importante,
principalmente, para os países em desenvolvimento dotados de florestas, como o
Brasil.
EcoD: O governo federal informou que prepara uma estratégia nacional
sobre o Redd+. Noticiamos, recentemente, projetos de alguns Estados
relacionados ao tema, como Acre e Mato Grosso. De que forma o Brasil avança,
nesse sentido?
Natalie Unterstell: Ainda estamos em uma negociação no âmbito
internacional, que tenta definir o que é, o que pode ser o mecanismo ou os
mecanismos nessa área de mitigação de emissões e preservação das florestas. Não
tem como eu te falar hoje: "olha, o mecanismo é este", assim como
podemos fazer por exemplo com o MDL [Mecanismo de Desenvolvimento Limpo].
Mas qual é o entendimento do Ministério do Meio Ambiente sobre o Redd+?
Natalie Unterstell: Eu penso que cabe uma pequena introdução ao
assunto, porque há bastante confusão sobre este tema. Tem iniciativas batizadas
de Redd, projetos que se auto-intitulam como Redd, mas que às vezes não
condizem com o mecanismo. Os princípios ainda não foram definidos. Aí tem uma
série de instituições e países que tentam disputar o conceito.
O conceito de Redd surgiu na
Convenção Quadro das Nações Unidas (UNFCCC) realizada em 2003. Na época, um
grupo de instituições não-governamentais brasileiras propôs um mecanismo de
redução compensada das emissões de carbono na atmosfera.
Foi também durante a COP-13 que o
conceito inicial foi ampliado pela segunda vez, e passou a ser conhecido como
Redd+. Isso significa que, além das reduções por desmatamento e degradação, ele
passou a abranger a tarefa da conservação florestal, do manejo sustentável e do
aumento dos estoques de carbono. O compromisso foi registrado no Plano de Ação de
Bali.
O que o Brasil propõe nas negociações internacionais sobre Redd+?
Que tenham incentivos tanto
financeiros, quanto técnicos e tecnológicos, que os países em desenvolvimento
trabalhem essa associação das florestas com as mudanças do clima, e isso requer
que os governos passem a desenvolver alguns instrumentos, como uma estratégia
ou um plano nacional. Essas sugestões também têm sido travadas no âmbito
internacional.
O Brasil já tem um plano?
O Brasil já tem vários planos. A
Amazônia tem várias ações que já trabalham na questão florestal, mas ainda nos
falta um plano nacional que integre o fator florestal com as mudanças do clima.
Nosso grande desafio é formular um instrumento que reconheça tudo que o Brasil
já tem em termos de políticas públicas, como um Sistema Nacional de
Monitoramento da Cobertura Florestal ou um Fundo Amazônia.
Mas é complicado, porque temos
que propor uma matriz de impacto para as políticas que estão aí - uma discussão
que já rende há alguns anos, e que nós esperamos que em 2013 avance ao ponto de
conseguirmos trazê-la para uma consulta pública.
Enquanto isso, nada de definir o Redd+ (risos)...
(Risos). Seria ruim o ministério
impor uma definição de Redd, porque o conceito está sendo negociado na
convenção. A visão que nos guia é a de que os países em desenvolvimento, que
tem florestas, vão ter ações diversas referentes ao desmatamento e a degradação
florestal, a conservação e ao manejo. A ministra Izabella [Teixeira, do Meio
Ambiente] tem dito isso de forma recorrente: que o Brasil deve passar de
emissor a um país que planta florestas.
Na própria COP-16 a Convenção
instituiu esses estímulos para que os países produzam estratégias nacionais,
que têm uma abordagens por fases. A fase um é que a gente planeja, a dois é a
que procuramos implementar e a fase três é quando eu já consigo fazer tudo em
uma escala nacional, por exemplo, envolvendo todos os biomas. A Caatinga não
tem o mesmo problema de desmatamento que nós vemos na Amazônia, mas tem uma questão
de degradação florestal que é importante.
Quando um país desenvolvido como a Noruega faz uma doação financeira ao
Brasil, por exemplo, em razão de o país ter reduzido o desmatamento e, por
conseguinte, as emissões de CO2 equivalentes, a contrapartida do doador é
basicamente ambiental?
Os países desenvolvidos têm o
compromisso voluntário de apoiar, perante a Convenção, os países em
desenvolvimento. A contrapartida deles, nesse caso, é ambiental, porque o mundo
todo ganha com a Amazônia preservada, em vez de desmatada.
E quais são os pontos mais complicados para desentravar as negociações
de Redd+?
Nas COPs sobre mudanças
climáticas, o Redd sempre foi muito comemorado porque é uma discussão que
avança mais rapidamente que as demais, principalmente na parte técnica. Nas
discussões no órgão de assessoramento há muitas decisões sobre o Redd, talvez
não nos detalhes que eu gostaria (risos). O que nós não conseguimos ainda foi
definir qualquer cara para esse mecanismo. Temos dúvidas do tipo: na hora que
eu tenho um resultado "x" de redução de emissões aqui no Brasil, para
onde é que eu mando a fim de que o cara me pague por esse resultado? No atual
momento, eu não consigo fazer o metting do financiamento com os resultados. Não
sei quanto tempo vai levar para resolver isso.
Os projetos anunciados por alguns Estados devem ser considerados
legítimos, uma vez que falta ainda uma definição mais consensual sobre o
mecanismo?
Temos uma visão positiva quando
nos deparamos com os movimentos subnacionais em relação ao Redd. Fizemos até um
levantamento em 2012, que está disponível no portal mma.gov.br/redd sobre as
políticas referentes ao Redd na Amazônia brasileira - de legislações a
projetos. Vimos que há um esforço notável de alguns governos para implantar
políticas nesse sentido.
Significa que eles estão
investindo nessa questão das mudanças do clima, começando o esforço pelas
florestas. Mas para que essas legislações tenham efeito, nós temos que garantir
que elas sejam implementadas, e aí entram o apoio financeiro e técnico.
No caso da Amazônia, já
conseguimos estruturar esse apoio por meio do Fundo Amazônia. O Acre mesmo tem
um projeto grande, de R$ 60 milhões, o Amazonas e Rondônia também estão com
projetos bem bacanas. Então essa é a fonte de recursos Redd+ para o Brasil por
enquanto.
A estratégia nacional é de responsabilidade do Ministério do Meio
Ambiente?
Não. É interministerial. O MMA
coordena um grupo de trabalho desde 2011, que envolve outros ministérios, como
o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o Itamaraty,
Planejamento, Agricultura, Fazenda, Funai, Casa Civil, Secretaria de Assuntos
Estratégicos, Ministério do Desenvolvimento Agrário.
Já avançamos em vários aspectos.
Em 2013, temos a meta de elaborar um documento, revisá-lo, e mandá-lo para o grupo
executivo das mudanças do clima entre o final de fevereiro e o início de março.
Esse grupo executivo pode definir alguns pontos em cima dele, então não dá para
adiantar nada. Vai tramitar este ano.
O Brasil tem feito parcerias com outros países?
Recebemos vários convites de
outros países para compartilhar as experiências do Brasil nessa área, no
sentido de realizarmos parcerias técnicas. O Fundo Amazônia tem uma janela para
apoiar projetos de outros países, entre eles um em fase de apresentação que envolve
a OTCA, ou seja, todos os países da bacia amazônica. Estamos negociando uma
parceria com a República Democrática do Congo, cuja bacia tem o segundo maior
estoque de florestas no mundo. Também temos negociado com Moçambique e
Tanzânia, pensado em ações conjuntas para essa área.
Fonte: Ecodesenvolvimento.com