Adotada com sucesso em outras cidades do mundo, a ideia de
cobrar dos motoristas taxas para que circulem por certas regiões do município
gera polêmica na capital paulista. Em evento sobre mobilidade urbana promovido
pela Editora Abril, Marcelo Cardinale Branco, secretário municipal de
Transportes, e João Paulo Amaral, do projeto Bike Anjo, defendem a implantação
do pedágio urbano em São Paulo para desafogar o trânsito.
O conceito de pedágio urbano - isto é, de cobrar dos
motoristas para que circulem por determinadas regiões da cidade - foi
implantado pela primeira vez em 1975, em Cingapura. Lá, os condutores são
obrigados a pagar para andar de carro de segunda a sexta-feira, das 7h30 às
19h30. A ideia, que a princípio é considerada absurda por muitos, deu certo:
dados do governo garantem que o trânsito teve uma redução de 47% no período da
manhã e de 34% à tarde, a procura por transportes públicos aumentou 63% e o uso
de automóveis caiu em 22%.
Mais de 35 anos depois, a ideia do pedágio urbano se
espalhou pelo mundo - entre as cidades que implantaram a iniciativa com sucesso
estão Londres e Estocolmo, na Europa -, mas continua gerando polêmica em São
Paulo. Grande parte da população é absolutamente contra a ideia de ter que
pagar para circular de carro pelas ruas da cidade. Enquanto o assunto é
debatido, dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) mostram que, nas
últimas quatro décadas, o número de carros na capital paulista aumentou 700%,
colocando o trânsito em uma das primeiras posições do ranking dos principais
problemas do município.
Durante o evento Cruzando Pontes - O Valor da Diversidade,
promovido nesta quarta-feira (25) pela Editora Abril para debater a questão da
mobilidade urbana, Marcelo Cardinale Branco, secretário municipal de
Transportes, e João Paulo Amaral, cofundador do projeto Bike Anjo, defenderam a
implantação do pedágio urbano na capital paulista para incentivar o uso
consciente de veículos e desafogar o trânsito da cidade.
"Muita gente não entende o conceito de pedágio urbano.
Acham que o governo quer cobrar para que os motoristas usem as ruas. Não é
isso. Essa taxa de utilização das viárias já é paga pelos cidadãos nos
impostos. O pedágio urbano propõe cobrar dos condutores os prejuízos que eles
causam à cidade ao optarem pelo uso de um veículo individual. É o princípio de
‘poluidor-pagador’ previsto no Direito Ambiental", explicou Cardinale, que
contou que, por ano, há um prejuízo de cerca de R$ 35 bilhões gerado pela
utilização de carros. A conta é paga por todos os cidadãos. "É justo?
Parece-me mais razoável cobrar esse prejuízo, apenas, de quem o causa, por meio
do pedágio urbano", opinou o secretário de Transportes.
CADÊ O TRANSPORTE PÚBLICO DE QUALIDADE?
Um dos argumentos daqueles que são contra o pedágio urbano é
a deficiência do sistema de transporte público de São Paulo. Dá para abrir mão
de utilizar o carro na capital, hoje, sem ganhar dores de cabeça para se
locomover de outra maneira? Para João Paulo - mais conhecido como JP na
comunidade de ciclistas - investir no setor é uma medida primordial que deve
vir junto com a implantação do pedágio urbano.
"Não é só instalar chips nos carros e colocar o pedágio
urbano para funcionar. A iniciativa deve englobar um pacote de ações. Entre
eles, o investimento em transporte público de qualidade. Mais do que um
desestímulo para andar de carro, o cidadão precisa ter um incentivo para optar
por outros meios de locomoção", afirmou JP. "Além disso, o governo
deve garantir para a população que o dinheiro arrecadado no pedágio será
investido na mobilidade urbana da cidade. Se provar que a iniciativa trará
benefícios ao município, a aceitação será maior", completou.
Cardinale concorda, mas defende que, em curto prazo, é
possível implantar a ideia do pedágio urbano nas regiões onde o transporte
público já é adequado. "A Avenida Paulista é um bom exemplo. Não temos 400
km de metrô, como a cidade de Londres, mas temos 70. Nesse perímetro já é
possível instalar o pedágio urbano para desafogar o trânsito", defendeu o
secretário de Transportes.
CULTURA DO COMPARTILHAMENTO
Para JP, iniciativas que visam transformar o espaço viário
para mudar, para melhor, a mobilidade nas cidades - como é o caso do pedágio
urbano - podem e devem ser incentivadas, mas precisam vir acompanhadas de uma
mudança de comportamento dos cidadãos. Caso contrário, a sociedade continuará
dependente dos carros.
"Nos anos 50, a indústria automobilística recebeu um
grande incentivo do governo JK e, desde então, há uma supervalorização dos
carros. Eles viraram o símbolo do progresso e se instituiu uma cultura de
preconceito contra outras formas de locomoção, contra as bikes, contra os
pedestres... Enquanto não a substituirmos por uma cultura de compartilhamento
do espaço público e de respeito pelo próximo, continuaremos vivendo o caos no
setor de mobilidade urbana", finalizou JP.
Fonte: Planeta Sustentável