Florestas em pé não são boas só para a biodiversidade. Elas
geram bilhões para a economia. Quando as tratarmos como empresas, aí, sim, o
desmatamento pode cair a zero. Ou abaixo de zero.
Um Maracanã de floresta acaba de desaparecer. Isso desde que
você começou a ler este texto, há 1 segundo. Amanhã, neste mesmo horário, você
levará a vida como sempre - esperamos. Mas os integrantes de 137 espécies de
plantas, animais e insetos, não. Eles terão o destino que 50 mil espécies por
ano têm: a extinção. Argumentos como os 15 Maracanãs de mata tropical
devastados desde o início deste parágrafo - agora, 17 -, são fortes, mas nem
sempre suficientes para que algo seja feito. Só que existe outro, talvez ainda
mais persuasivo: dinheiro não dá em árvore, mas árvore dá dinheiro.
Hoje, manter uma floresta em pé é negócio da China. Em uma
área estratégica perto do rio Yang Tsé, o governo chinês paga US$ 450 aos
fazendeiros por hectare reflorestado. O objetivo é conter as enchentes que
alteram o fluxo de água do rio. Equilíbrio ecológico, manutenção do
ecossistema, mais espécies preservadas, esses são os objetivos do Partido
Comunista Chinês? Não.
Trata-se de um investimento. O reflorestamento mantém o
curso do rio estável e as árvores, sozinhas, aumentam a quantidade de chuva -
as plantas liberam vapor d’água durante a fotossíntese. Resultado: mais água no
Yang Tsé. O que isso tem a ver com dinheiro? A água alimenta turbinas das
hidrelétricas distribuídas pelo rio - inclusive a megausina de Três Gargantas,
50% maior que Itaipu, que abriu as comportas em 2008.
Investindo em reflorestamento, os chineses agem de forma
pragmática. Pagar fazendeiros = mais árvores. Mais árvores = mais água no rio.
Mais água = mais energia elétrica barata (ainda mais no país que inaugura duas
usinas a carvão por semana para dar conta de crescer como cresce). Mais energia
barata, mais produção para a economia - e dinheiro para pagar os
reflorestadores. O final dessa equação é surreal para os padrões brasileiros. A
China, nação que mais polui e que mais consome matéria-prima, tem índice de
desmatamento zero. Abaixo de zero, até: eles plantam mais árvores do que
derrubam.
Não é só lá que as árvores valem dinheiro. No país que
melhor preserva sua floresta tropical acontece a mesma coisa. É a Costa Rica.
Os donos de terras de lá são pagos para manter áreas de floresta intactas.
Parte do dinheiro vem de uma companhia hidrelétrica interessada em manter os
rios que usa fluindo. Florestas, hidrelétricas... Só esses dois pontos já
deixam claro que o Brasil tem algo a aprender. O berço da maior usina
hidrelétrica inteiramente brasileira (e 3ª do mundo) fica em plena Floresta
Amazônica. É Belo Monte, no rio Xingu, a 40 quilômetros da cidade de Altamira,
no Pará.
A partir de 2015, ela vai servir 26 milhões de habitantes. O
dado mais célebre dela é outro: os 512 km2 de floresta inundada por suas
barragens. É a área de uma cidade média, toda debaixo d’água. Mesmo assim, a
usina pode fazer mais bem do que mal para a mata. Pelo menos nas próximas
décadas. Se seguirmos a lógica da China e da Costa Rica, faz sentido que Belo
Monte pague algo pela manutenção da floresta, já que sem ela não tem chuva o
bastante, e sem chuva o bastante não tem energia.
E não são só hidrelétricas que lucram com as árvores de pé,
e que podem pagar para mantê-las assim. O ciclo de chuvas da Floresta Amazônica
é o que garante nossas safras agrícolas - sem ele, boa parte do país seria um
deserto. A ONU calcula que mesmo uma queda mínima na quantidade de chuvas que a
floresta produz pode trazer prejuízos entre US$ 1 bilhão a US$ 30 bilhões para
a agricultura nos arredores da Amazônia.
As estimativas são imprecisas por uma limitação da ciência:
não há como saber se um tanto de desmatamento vai provocar outro tanto de
bagunça no ritmo das chuvas. Mas todo mundo sabe que a relação existe. O
problema é quantificá-la. Mesmo assim, faz sentido imaginar um futuro em que os
produtores agrícolas paguem pela preservação de florestas como uma espécie de
seguro contra a falta de chuvas.
Claro que, se ficar só na conversa, nunca vai acontecer
nada. Mas um grupo de cientistas americanos deu um passo importante. Criaram um
software que busca calcular com alguma precisão quanto uma área desmatada ou
reflorestada pode gerar em lucros (ou prejuízos) para a economia de uma região.
O nome do programa é engenhoso: InVEST (Valoração Integrada de Serviços e
Compensações do Ecossistema, em inglês - haja paciência para inventar uma sigla
dessas). E ele já saiu do mundo das ideias: é o software que a China usa para
gerenciar o retorno de seu reflorestamento. Enquanto isso, devastamos mais 200
Maracanãs no tempo que você levou para ler este texto.
Fonte: Planeta Sustentável