O ano de 2009 não suscita boas lembranças aos
frigoríficos brasileiros que mantêm operações na Amazônia. Foi nessa data que
eles se viram sob a mira de duas instituições com potencial para transformar a
vida de qualquer empresa num inferno: o Ministério Público e a ONG Greenpeace.
A acusação de ambos era que os frigoríficos estavam envolvidos com o
desmatamento da região ao comprar carne de milhares de pecuaristas que
desrespeitam a legislação ambiental.
As denúncias também mancharam a imagem dos
varejistas, entre eles os três maiores do país: Walmart, Carrefour e Pão de
Açúcar. Afinal, eles tinham esses frigoríficos como importantes fornecedores de
carne e, segundo o Greenpeace, eram "parceiros silenciosos do crime".
Na época, todos os envolvidos declararam que se mexeriam para resolver o
problema.
Parte dos grandes frigoríficos criou políticas para
monitorar a ação dos pecuaristas de quem compra. Já os varejistas, por meio da
Associação Brasileira de Supermercados (Abras), apresentaram no final de 2009
um programa ambicioso de controle de origem da carne. Ele incluía severas
exigências para os frigoríficos. Na prática, porém, passados quase quatro anos,
pouco avançou. A boa notícia é que pelo menos um dos projetos lançados com base
nas denúncias saiu do papel.
Ao ver que o sistema imaginado pela Abras
emperrava, o Walmart decidiu criar o próprio programa. A empresa começa agora a
divulgar as medidas adotadas para reduzir o risco de que sua marca volte a ser
associada ao desmatamento.
O passo mais audacioso dado pelo varejista é que
ele tem agora um sistema de tecnologia que lhe permite calcular o "risco
socioambiental" de cada uma das fazendas que abastecem seus supermercados.
Até 2015, todo o fornecimento de carne poderá ser rastreado. Funciona da
seguinte forma: feito um pedido de carne pelo software, os frigoríficos
informam ao varejista dados da propriedade que irá suprir aquela demanda. O
sistema cruza essas informações com imagens de satélite e dados oficiais do
governo. Após o cruzamento, o programa qualifica o pecuarista com base em
critérios: a propriedade não pode estar localizada em área indígena, protegida,
embargada pelo Ibama ou que tenha sido desmatada após outubro de 2009. Além
disso, deve estar fora da lista suja do trabalho escravo. Se infringir qualquer
uma dessas normas, a fazenda será tachada de "inapta", o pedido será
bloqueado e o frigorífico terá de suprir o varejista com carne de outra
propriedade. O pecuarista não será, porém, banido para sempre. "Queremos
que os produtores sejam mais responsáveis e, por isso, eles ganharão tempo para
se adequar", diz Maurício Almada, diretor de perecíveis do Walmart.
Monitoramento
O sistema começou a ser desenvolvido em 2011 e,
desde meados do ano passado, vem sendo testado com a ajuda do frigorífico JBS,
o maior do mundo.
Só na Amazônia o JBS negocia com cerca de 30 000
fornecedores de carne. O curioso é que JBS e Marfrig, outro grande frigorífico,
já tinham os próprios sistemas de rastreamento. Por que então o Walmart
investiu tempo e 500 000 reais para ter seu software de rastreamento? Diz
Almada: "Sempre que fomos questionados pela opinião pública tivemos de nos
comportar como meros espectadores porque não tínhamos controle da cadeia como
um todo". A meta do varejista é que até junho deste ano todos os
frigoríficos comecem a fornecer dados para o sistema. Caso isso não ocorra,
eles terão as vendas para o varejista suspensas. O objetivo é que em dois anos
o programa monitore 100% da produção de carne vinda da região.
A iniciativa do Walmart pode ajudar a reduzir o
impacto da pecuária no desmatamento. Não vai, porém, solucionar de vez o
problema. Como apontam especialistas do Imazon, ONG dedicada à pesquisa na
Amazônia, os sistemas de rastreamento ainda não incluem o primeiro elo da
cadeia: as fazendas que vendem novilhos aos produtores que vão engordá-los para
fornecer aos frigoríficos. "Ainda assim, não há dúvidas de que o movimento
do Walmart deve ser elogiado", diz Marcio Astrini, coordenador do
Greenpeace na Amazônia.
Fonte: Planeta Sustentável