É preciso respeitar o que diz a lei, quando obriga a criação
de serviços de coleta seletiva, a fim de absorver os catadores. | Foto: WilsonDias/ABr
O fim dos lixões em todo o país, previsto para ocorrer a
partir de agosto de 2014, representará um ganho ambiental, mas poderá gerar um
passivo social. A Lei 12.305/10, que instituiu a Política Nacional de Resíduos
Sólidos, obriga os municípios a depositarem o lixo em aterros sanitários
controlados, o que significa um melhor ordenamento dos resíduos, que deixarão
de poluir o meio ambiente, mas ao mesmo tempo representa o fim do trabalho para
milhares de catadores.
No estado do Rio de Janeiro, o fechamento do Aterro
Sanitário de Jardim Gramacho, na Baixada Fluminense, em junho do ano passado,
às vésperas da Rio+20 (Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento
Sustentável), provocou uma melhora significativa na qualidade de vida da
região, mas deixou milhares de famílias sem a fonte de renda diária. Apesar de
ter recebido uma indenização de R$ 14 mil, a maioria dos trabalhadores gastou o
dinheiro sem que isso tenha garantido uma nova forma de trabalho. Em todo o
estado, a estimativa é que pelo menos 40 mil pessoas vivam diretamente da
reciclagem.
O tema foi discutido durante a instalação da Comissão
Especial da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), criada
para investigar a erradicação dos lixões fluminenses. Para o ambientalista
Sergio Ricardo, é preciso respeitar o que diz a lei, quando obriga a criação de
serviços de coleta seletiva, a fim de absorver os catadores.
“A lei nacional do resíduo sólido está sendo desrespeitada.
Estão desativando os lixões, mas mantendo um processo de exclusão com os
catadores de material reciclável. Eles não estão sendo indenizados, com exceção
de Gramacho, e neste momento estão sem trabalho e sem renda”, disse o
ambientalista.
A vice-presidenta da comissão, deputada Aspásia Camargo
(PV), destacou a necessidade de se conciliar os ganhos ambientais com o
aproveitamento da mão de obra dos catadores. “O problema não é apenas erradicar
os lixões, mas também fazer com que o novo modelo de tratamento de lixo seja o
melhor possível tecnologicamente e humanamente, aproveitando as pessoas. Esta
comissão especial está concentrada nos bolsões de pobreza que estão sofrendo
muito com a transição da política de erradicação dos lixões”, declarou.
A presidência da comissão coube à deputada Janira Rocha
(PSOL), que defende a inclusão dos catadores por meio de cooperativas. “Na
prática, quando a gente vai fiscalizar o que está ocorrendo, os catadores não
estão incluídos. Muitos dos recursos que deveriam chegar a eles pelas
prefeituras simplesmente somem. O objetivo é fiscalizar o processo de
implantação da lei de resíduos sólidos”, disse Janira.
Um dos principais problemas sociais no estado é no entorno
do antigo lixão de Itaoca, no município de São Gonçalo, na região
metropolitana. Depois que o local foi fechado, em fevereiro do ano passado, 786
famílias perderam o seu sustento, segundo denunciou o ex-catador Adeir Albino
da Silva. “A situação é a pior possível. Muitas pessoas estão doentes, perderam
a força para trabalhar, mas não se aposentaram. É uma verdadeira calamidade
pública. Tiraram o lixão e não nos falaram nada. Não temos mais o lixo para
reciclar. A situação é de abandono e de caos total. Estamos na mais pura
miséria”, denunciou.
A ex-catadora Sílvia Maria, que de uma hora para outra
perdeu a sua fonte de dinheiro, defende que haja pelo menos uma indenização. “A
gente está correndo atrás de uma indenização que pelo menos possa dar para um
carrinho de pipoca ou de hambúrguer. Eu não tenho como pagar o INSS para me
aposentar. De onde eu vou tirar esse dinheiro, se não tem como?”, indagou
Sílvia Maria, que sobrevive com cerca de R$ 70 que recebe do Programa Bolsa
Família, além de doações de roupas e comida entregues por vizinhos e igrejas.
Por Vladimir Platonow - Agência Brasil
Fonte: CicloVivo