Ao redor de polo industrial em construção nasce uma área
verde maior que o Parque da Tijuca
Cortado por estradas que dão
acesso à Serra Fluminense e à Região dos Lagos, o município de Itaboraí, a 50
quilômetros do Rio, passava despercebido aos viajantes. Em 2006, no entanto,
teve início uma reviravolta, com o anúncio da construção do complexo
petroquímico do Comperj. Orçado em 36 bilhões de reais, o empreendimento
capitaneado pela Petrobras já desponta na paisagem com suas enormes chaminés,
mas outra transformação, ainda pouco visível, está em pleno andamento. Trata-se
do plantio de 4 milhões de mudas, englobando 84 espécies da Mata Atlântica,
para formar um gigantesco cinturão paisagístico em torno do parque fabril.
Quando a operação estiver
concluída, em 2020, a área verde deverá ocupar cerca de 4 500 hectares, espaço
superior ao de um dos maiores símbolos cariocas, a Floresta da Tijuca, com seus
3 900 hectares. É tão grande que, se fosse transplantada para o Rio, a
vegetação encobriria uma extensão que vai de São Conrado até o Centro, passando
pelos bairros litorâneos.
Iniciado em outubro de 2011, o
reflorestamento já ocupa uma área equivalente a 780 campos de futebol. Entre as
espécies escolhidas estão exemplares ameaçados da flora brasileira, como o
pau-brasil e o jacarandá. "Traremos de volta uma diversidade de plantas e
animais que há décadas deixou de existir", acredita Sérgio Valle, gerente
de implantação do Comperj.
Para viabilizar a iniciativa, foi
preciso construir um viveiro florestal de 11 mil metros quadrados, onde a cada
seis meses são cultivadas 300 000 mudas. Cerca de 170 trabalhadores se revezam
para garantir a dosagem correta de sol, água e nutrientes necessários ao crescimento
das várias espécies, assim como o controle de pragas. Entre os profissionais da
equipe há biólogos, engenheiros florestais, agrônomos e veterinários.
Apesar de a iniciativa ainda
estar no começo, ela já faz efeito no ecossistema local. Após o crescimento das
primeiras árvores, animais selvagens desaparecidos havia tempos voltaram a
Itaboraí. É comum observar agora a presença de seriemas, cachorros-do-mato,
jacarés e cobras. O terreno também teve de ser recuperado. Ocupada ao longo de
décadas por fazendas produtoras de gado, coco e laranja, a região apresentava
solo empobrecido devido às constantes queimadas.
O projeto contempla ainda o
plantio em terras protegidas por lei, como as margens de rio e os topos de
morro. Dessa forma, devem surgir verdadeiros corredores verdes ao longo dos
leitos dos rios Macacu e Caceribu, conectando diversas reservas ambientais.
"Vamos acompanhar o desenvolvimento das mudas até que atinjam três anos,
tempo considerado suficiente para a floresta se desenvolver sozinha", explica
Júlia Bastos, consultora do projeto.
Criar cinturões de natureza em
torno de grandes fábricas é uma tendência mundial, como forma de atenuar os
danos ambientais, com impacto circunscrito à região. No caso do Comperj, a
inspiração veio da cidade indiana de Jamnagar, onde nos anos 90 se instalou a
terceira maior refinaria de petróleo do mundo. Ao redor do complexo, um projeto
pioneiro criou o maior cinturão industrial verde do planeta, somando atualmente
650 mil hectares.
Credita-se ao parque, que abriga
a maior plantação de manga da Ásia, a redução de 2 graus em média na
temperatura local. Esse tipo de cerco traz ainda outro benefício, que é a
filtragem dos poluentes emitidos. Ao realizarem a fotossíntese, as plantas
transformam o gás carbônico, principal responsável pelo aquecimento global, em
oxigênio puro. O mutirão ecológico de Itaboraí também tem um paralelo na
história carioca.
Assim como o município
fluminense, o Maciço da Tijuca encontrava-se em elevado grau de deterioração no
século XIX. Com as terras exauridas pelo plantio intensivo de café e açúcar, as
montanhas enfrentavam acelerado processo de erosão, enquanto a população do Rio
via escassear suas fontes de água potável. Preocupado com a iminente crise de
abastecimento na capital do país, o imperador dom Pedro II ordenou que a área
fosse recuperada. Sob o comando do major Manoel Gomes Archer, o trabalho,
iniciado em 1862, só terminou doze anos depois, período em que foram plantadas
80 mil mudas de espécies nativas.
Com início de funcionamento
previsto para 2015, o Comperj é uma das maiores obras em curso no país. A
expectativa é que ele impulsione a economia fluminense com a criação de até
168 mil empregos diretos e indiretos. Composto de fábricas geradoras de
derivados do petróleo, como querosene e gasolina, o parque industrial será
capaz de refinar até 165 mil barris do produto diariamente. Também vai
processar o gás natural extraído das camadas submarinas do pré-sal.
Com a urgência das questões
ambientais e a preocupação com a sustentabilidade na ordem do dia do setor
econômico, o cinturão verde mostra que é possível conciliar desenvolvimento e
proteção ao meio ambiente de forma equilibrada.
Fonte: Planeta Sustentável