Bons investimentos públicos reduzem gastos, melhoram a vida
da população e ajudam o meio ambiente
O Brasil está entre as dez maiores economias do mundo, mas
continua tendo índices de desigualdade (como o Coeficiente de Gini e o Índice
de Desenvolvimento Humano (IDH) que deixam a desejar. Por esse motivo, muitas
vezes o Estado brasileiro ainda é visto como um empecilho e não como um parceiro
para melhoria da vida da população. Uma característica dos países que despontam
com bons índices de IDH e Gini é o investimento em infraestrutura e uma relação
de parceria entre o Estado e a população.
Uma prova do sucesso dessa administração pública é a cidade
de Boras, na Suécia. O município conseguiu reduzir em 99% o volume de lixo
destinado aos aterros, ao investir em tecnologia e contar com a ajuda da
população. Dessa forma, houve diminuição no valor da conta de luz e também no
preço do transporte público. A relação do lixo com o setor energético e de
transportes foi feita através da implantação do processo de biodigestão dos
resíduos, da técnica de incineração gaseificada e da coleta seletiva eficiente.
Todas essas práticas juntas despoluíram o rio Viskan, que já foi um esgoto a
céu aberto, e permitiram à cidade alcançar o incrível índice de produção de
apenas 1% de resíduos destinados aos aterros sanitários.
Biodigestão
O benefício da biodigestão é aproveitar ao máximo o lixo.
Esse processo funciona como uma composteira seca em grande escala e num sistema
fechado. Ou seja, as bactérias decompõem o lixo orgânico, que neste caso pode
ser de qualquer origem, inclusive dejetos humanos e de animais, mas com o
diferencial de que todos os gases produzidos no processo não são lançados na
atmosfera. A decomposição da matéria orgânica produz metano (CH4) e gás
carbônico (CO²), gases que são a composição básica do biogás, podendo ser
utilizado em diversos setores da economia em substituição ao gás natural e GLP,
dois combustíveis de origem fóssil, além da possibilidade de ser utilizado na
indústria, em termelétricas e na frota de veículos do transporte público. Assim
como em uma composteira, os resíduos finais são biofertilizantes ricos em
nutrientes.
Nos lixões, esses gases da decomposição são liberados para a
atmosfera, intensificando o problema do aquecimento global. Em aterros, o
metano (CH4) costuma ser queimado, mas sem uma finalidade muito específica,
apenas para que ele se transforme em gás carbônico e diminua seu impacto na
atmosfera. O CH4 é um gás de efeito estufa cujo efeito é da ordem de 20 vezes
superior ao CO², contribuindo fortemente para o desequilíbrio do efeito estufa.
Reciclagem e gaseificação
O sistema de reciclagem em Boras é muito eficiente e conta
com a importante participação da população. O lixo doméstico é colocado em
sacos de lixo de duas cores, um para lixo orgânico e outro para lixo
reciclável. Uma máquina diferencia as cores dos sacos e faz a triagem inicial.
Uma outra opção é a venda em pontos de coleta em supermercados - basta colocar
o lixo na máquina para receber um valor de acordo com o volume de material.
Separar o orgânico do lixo reciclável já é uma maneira de potencializar a
reciclagem no município e facilitar o andamento dessa cadeia produtiva em
qualquer país.
A parcela de lixo que não é orgânico nem reciclável é
incinerada, mas não da maneira tradicional (em que tudo é transformado em
cinzas e CO²). O processo utilizado é conhecido como gaseificação, no qual o resíduo
é incinerado em alta pressão junto com vapor d’água e ar. Assim, além de
alimentar termelétricas, o syngas, um gás sintético que é matéria prima para
diversos produtos, dentre eles fertilizantes e combustível, também é produzido.
Já o calor dos gases residuais é aproveitado em uma rede de aquecedores
urbanos, evitando o consumo de qualquer outro combustível para gerar calor.
Um processo tão eficiente e prático pode exigir, de início,
uma quantia elevada de recursos financeiros, mas as consequências do manejo
inadequado do lixo são decerto muito mais caras aos cofres públicos do que o
investimento em tecnologia e conscientização. Com o manejo adequado dos
resíduos urbanos, a cidade de Boras caminha para a independência de
combustíveis fósseis ao usar o biogás para produzir energia e mover o
transporte público. A cidade inclusive importa lixo orgânico dos países
vizinhos para alimentar seus biodigestores. Assim, o retorno dessa
independência dos combustíveis traz benefício tanto financeiramente, quanto para
o meio ambiente.
Boras é uma cidade pequena, com cerca de 60 mil habitantes.
Embora seja complexa a implantação de um projeto similar em grandes metrópoles
como São Paulo, com população de 11 milhões de pessoas, essa pequenas
iniciativas podem servir de modelo para o desenvolvimento e alternativas
focadas na realidade das cidades brasileira.
Fonte: eCycle